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Wolverine não, WolverinA! (ou Heteronormatismo e Machismo nos Produtos com Supers)

“EU SÓ NAMORO SUPER-HERÓIS”

Tá vendo a frase acima? Então, ela estava numa camiseta, como essa que a menina asiática abaixo está vestindo. A camiseta estava na Livraria Cultura e sim, era escrito em rosa sobre fundo cinza, mas tá, mesmo assim eu queria vesti-la e usá-la no dia a dia. Há algum tempo seria um problema, uma piada, mas hoje seria um sinal de coragem, de luta mesmo. Mas essa luta não é apoiada pela indústria que faz produtos para super-heróis e sabe por quê? Porque a camiseta em questão era modelo baby look. E digamos que meu corpo masculino não comporta uma camiseta baby look.

"Eu só namoro pagodeiro"

“Eu só namoro pagodeiro”

Por décadas, os criadores de quadrinhos de super-heróis presumiram que o público de suas histórias era predominantemente masculino. Houve muitas heroínas durante a história dos comics, mas a maioria tinha antes o propósito de alimentar as fantasias de garotos adolescentes do que focar o interesse de uma audiência feminina. Poucas delas tinham um título regular de sucesso. Stan Lee se perguntava: “poucas garotas leem quadrinhos porque eles são voltados para um público masculino ou eles são voltados para um público masculino porque poucas garotas os leem?”.

Imagino, caro “O Cara”, ou melhor “The Man”, que a informação certa seja a primeira, mas também a resposta seja porque os homens são preconceituosos com as mulheres. É tipo “mulher no volante, perigo constante” é tipo “mulher com gibi não entende nada disso aí”.

"Grandes carros, pequenos bilaus"

“Grandes carros, pequenos bilaus”

Hoje foi postado numa lista de discussão de quadrinhos os  modelos de camisetas acima que estavam sendo vendidas nas lojas Riachuelo. “Procurando uma garota ligeirinha”, dizia a camiseta do Flash. Porque as garotas tem de ser atrevidas e tem que ser ligeirinhas no primeiro encontro, viu? A do Batman: “Carro legal. Curte garotas doidas. Tem problemas”, a camiseta é machista e diz que homens legais tem que ter carrões, curtir garotas doidas e por isso ter problemas está de boa. Daqui a pouco vão dizer que bater em mulheres também é massa. Pra finalizar, a camisa do Superman dizia “Eu sou o Superman DELA”, não seria tão mais avant-garde se ele dissesse: “Eu sou o Superman DELE”? E isso não sugere nenhum relacionamento, mas que o cara curte o Superman, ora bolas.

"Racha, tu sabe que quem treina pra ser mulherzinha do Bátima é o Robin, nem vem!"

“Racha, tu sabe que quem treina pra ser mulherzinha do Bátima é o Robin, nem vem!”

Em uma reportagem do Daily Mail, que você pode conferir aqui, cujo título é “Garotos querem SER super-heróis, mas meninas só podem se casar com eles”, o veículo de notícias denuncia o machismo e heteronormatismo nos produtos de super-heróis, acusando principalmente a DC Comics. Não que a Marvel fique de fora dessa não. Mas havia uma camiseta da Walmart que dizia: “Treinando para ser a MULHER do Batman”. Não, ela não treinava para ser a Batgirl ou a Batwoman. Ela treinava para ser a MULHER do Batman.

"Deu Zica nio Ziraldo!"

“Deu Zica nio Ziraldo!”

É incrível como na sociedade de hoje, a mulher ainda só é vista como um ser humano válido se ela se casa e se se casa com alguém importante. Como estávamos conversando outro dia entre amigos, que está embutida na nossa cultura os garçons oferecerem a conta aos homens, mesmo sendo as mulheres que vão pagar. Hoje, meus amigos, boa parte das famílias é governada por mulheres, mães solteiras. Não só no Brasil, no mundo todo. Elas são as superheroínas. Um bom exemplo é a Supermãe, do homofóbico Ziraldo, um velhinho tão bom e inteligente que decepcionou muitos fãs se mostrando intolerante.

Mas um fato que não se pode negar é que a indústria dos quadrinhos talvez seja a indústria cultural mais heteronormativa e machista de todas. Um exemplo patente é o pastor/pseudo-deputado Marco Feliciano ostentando sua coleção de action figures. Esse sim, mais do que possam acusar qualquer menina, é um colecionador poser. Outro exemplo é o preconceito que a imprensa especializada e os artistas brasileiros tem contra os gays.

A WOLVERINA Maria Trotski.

A WOLVERINA Maria Trotski.

Foi noticiado também há um tempo, que uma menininha brasileira, a Maria Trotski pediu à sua mãe para se fantasiar de Wolverine na festa de Halloween. A mãe não pensou duas vezes e preparou a fantasia para a menina, e ficou um amor. Para conhecer melhor a história da Maria, clique aqui. Mas claro, não existe fantasia de Wolverine para as meninas, nem que seja seguindo a Rule 63, em que qualquer personagem criado pode ter uma versão de vários gêneros. Esse mês, a Marvel mostrou um novo visual para a X-23, a clone do Wolverine, e qual é a surpresa, ela estava vestida com o uniforme clássico do baixinho peludo canadense, para desgosto de muitos fãs ortodoxos.

Quando perguntada por gente babaca e newbie se a menina fantasiada de WolverinA era a namoradinha do Wolverine (sim, porque a garota tem de ser relegada ao papel de namorada), a menininha respondeu: “E por acaso eu tou vestida de Jean Grey? Acho que não, né?”. Maria mandou um beijinho no ombro para os heteronormativos, os machistas e para a sociedade patriarcal, que, tadinha, não pode pôr os pés na Ilha Paraiso. E então, senhor Stan Lee, “O Homem”, como é que fica a sua pergunta mesmo?

Agradeço à amiga Annie O’Reilly por deixar meu feminismo mais à flor da pele dia a dia.

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Guilherme “Smee” Sfredo Miorando nasceu em Erechim em 1984. É Mestre em Memória Social e Bens Culturais, onde pesquisa quadrinhos e sexualidades. É especialista em Imagem Publicitária e bacharel em Publicidade e Propaganda. Ministra aula de quadrinhos e trabalha com design editorial e roteiros. Já trabalhou em museus e com venda de livros e publicidade. É pesquisador associado do Cult de Cultura e da ASPAS (Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial). Faz parte do conselho editorial da Não Editora. Co-roteirizou o premiado curta-metragem Todos os Balões vão Para o Céu. Seu livro de contos Vemos as Coisas como Somos foi selecionado pelo IEL-RS em 2012. A partir de 2014, publicou ao menos um quadrinho independente por ano. Loja de Conveniências, sua primeira narrativa longa foi lançada em 2014. Em 2015 participou da coletânea de HQs LGBT Boys Love. Em 2017 colaborou com o quadrinho A Liga dos Pampas de Jader Corrêa, que explora mitos gauchescos. Também lançou Desastres Ambulantes em parceria com Romi Carlos, um quadrinhos sobre segunda guerra mundial e OVNIs, que foi selecionado pelo edital estadual PROAC/SP. Em 2017, publicou Abandonados Pelos Deuses: Sigrid, com Thiago Krening e Cristian Santos e também Fratura Exposta: REDUX com Jader Corrêa. Também escreve os roteiros para os super-heróis portoalegrenses Super Tinga & Abelha-Girl. Mantém o blog sobre quadrinhos splashpages.wordpress.com há mais de 10 anos.

19 comentários

  1. Milton Feitosa diz

    Acho PROFUNDAMENTE RIDÍCULO todos os seus comentários! Qual o problema? Sério, qual o problema de ser NAMORADA de super herói? A mulher, OBRIGATORIAMENTE, tem que ser super-heroína? Desculpe, mas o Wolverine, não sei se você sabe, É UM PERSONAGEM MASCULINO! Por isso, NÃO VAI HAVER FANTASIAS FEMININAS! Stan Lee, na sua época, tinha uma visão machista? TINHA! Mas ele NÃO É OBRIGADO A MUDAR A VISÃO DELE! Na época dele, a visão era essa! Sua visão é PRECONCEITUOSA, pois reclama UMA OBRIGATORIEDADE PELA MUDANÇA! As pessoas não mudam de opinião PORQUE SÃO OBRIGADAS! O NOME DISSO É DITADURA, PRECONCEITO, ou alguma coisa nesse nível! A menina gosta de super-heróis? ÓTIMO! SOU O PRIMEIRO A FAZER A FESTA! Mas ela não pode ser a CAPITÃ AMÉRICA, a DRA. ESTRANHA, ou a COLOSSUS! PORQUE OS PERSONAGENS SÃO MACULINOS! SIMPLES ASSIM!

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    • guilhermesmee diz

      Começou o reacismo. Vamos la, alguns comentários que achaste ridículos que fiz nos grupos de HQ no facebook:
      “Quando vocês se tornarem uma minoria ou tiverem um filho ou parente que pertence a uma aí você venham comentar, enquanto isso, não tem cacife, não, amigues.”
      “Se a notícia fosse tão MERDA assim como vcs dizem, não estaria no Daily Mail, estaria?”
      “As pessoa reclamam assim: “Que merda! Que absurdo!” Mas não usam argumentos convincentes, ou postam um artigo mostrando como é errado defender que produtos de super-heróis sejam pra todos.”
      Beleza, cara, vamos com uma resposta boa pra ti. Aqui diz que tu estudou enfermagem. O que diria se te dissessem que enfermagem só está disponível para mulheres, porque é um curso que só mulher faz. E não tem porque fazer esse curso para homens porque, bem, a maioria que faz esse curso é mulheres. Quer um curso de homem, vai ser médico. É assim que você quer ser tratado?

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    • Respeito sua opinião, mas acho que vc deveria contar até 10 e reler seu comentário. Porque diabos uma garotinha não poderia usar a fantasia que ela quisesse? A honra dos teus super heróis favoritos é tão frágil assim?

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  2. Wanderson Dias diz

    Top Gui.. conheci seu site a pouco tempo e já é um dos meus favoritos. Excelentes resenhas desse nosso querido mundo das HQs. Acredito que umas das coisas que, ao longo da história, criou esse sentimento machista foi que constantemente estávamos em guerra. Daí a força fala mais alto. Em sociedades onde os “deuses” mais poderosos são homens as mulheres tendem a ficar em segundo plano. Mas hoje as mulheres vêm conquistando cada vez mais seu espaço nessa sociedade ainda masculina. Pelo lado positivo, estamos vivendo uma quebra de um dos maiores paradigmas da sociedade. Desde à era das cavernas. A igualdade de sexo. Um feito que será possível graças ao capitalismo. Quem diria, Marx!

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    • guilhermesmee diz

      Hahah é verdade, Wanderson, nada que tenha dinheiro envolvido é impossível de mudar! Só espero que pra melhor! Valeu pelos elogios! Abraços!

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  3. Cara, tenho curtido demais essa página. Sobre este artigo, se levarmos em conta os quadrinhos franceses, a coisa muda muito de quadro… mas está valendo. Ficou subentendido que você focou o universo Marvel/DC (que é um mercado tão forte, que quase podemos falar “HQ norte-americana” e “HQ Marvel/DC”). Atualmente tenho feito uma tese sobre Quadrinhos. Estou em Paris, participando de alguns eventos. Gostaria de trocar umas ideias contigo, em forma de entrevista (por e-mail). Talvez use o material na tese. Tá aí meu contato: johannlufter@yahoo.com.br.

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    • guilhermesmee diz

      Oi Lucas! Sim, foquei mais em Marvel e Dc, que é o que entendo mais mesmo. Que legal que curtiu o blog, continue acompanhando! Vou entrar em contato pelo e-mail! Abraços!

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  4. Rodrigo Portugal diz

    Só um detalhe: Não sei se você sabe, mas “Wolverine”, antes de ser um super-herói, é um animal e, no inglês, não há diferenciação de sexo para o nome dos animais.

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  5. wolverinE diz

    Eita que o mundo tá chato mesmo viu com essa geração pokemon ,excluindo agora essa página da minha live do face ,só escreveu bobagem esse cara.

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  6. Cara, só acho que vc interpretou a maioria dessas estampas sob um ângulo diferente dá intenção do autor. Tipo a do Batman, ela não me parece uma apologia aos comportamentos obtusos do personagem, e sim uma tiração de sarro destas falhas de caráter. É como se fosse o perfil do Tinder do Batman, que todos sabemos ser um cara com problemas. A do flash me pareceu bem inocente, e a do superhomem é só normativa mesmo. Não dá pra exigir que tudo seja politicamente engajado o tempo todo.

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  7. Olá, Gui! Achei e continuo achando excelente ver as minorias sendo representadas nos quadrinhos, os gêneros sendo postos à prova, a sexualidade dos heróis sendo questionada. Eu adoro!

    Uma coisa que me faz refletir bastante é: que diferença faz se o Homem de Ferro for Garota de Ferro? Se o Capitão América for apaixonado pelo Bucky? Se a Mulher Maravilha for bissexual (queer não)? Se o Batman e o Robin tem fetiche de daddy-son? Se O Thor for A Thor?

    Vejo por aí muita gente batendo nesta tecla que nem devia estar sendo batida. As editoras, até meio tardiamente, estão buscando a representatividade, ainda que seja visando maiores vendas ou ampliação do público. O importante é ser representado, algo que um homem hétero, branco, magro e bem de vida não compreende, por isto é fã do Batman, do Superman…

    Gosto muito de ver críticos redigindo textos enormes elogiando HQs boas, elogiando sua narrativa, sua arte, sua estrutura. Mas quando o assunto é a troca do gênero do Thor, a história não importa, não importa o quão bem escrita seja, o quão excelente os desenhos são. O que importa é que o Thor virou mulher e isso incomoda.

    O que eu quero dizer é: as pessoas estão se atendo a detalhes e não estão curtindo o panorama geral.

    Cadê a paz que todo mundo pede?

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    • Guilherme Smee diz

      É verdade, Lucas! E vendo as respostas para esse post em grupos do Facebook me dá mais desesperança ainda. principalmente porque as pessoas não te dão nem o benefício da dúvida. Leem só a chamada e começam a tacar pedras. Aí fica difícil quando as pessoas não estão dispostas nem a refletir. E a tal paz fica mais distante. Bem, obrigado pelas palavras e pelo incentivo! Abraços!

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  8. Olha, concordo com quase tudo, menos uma coisa: WolverinA.

    Wolverine é uma palavra que serve para os dois sexos. O Wolverine. A Wolverine. Ela já é ótima assim. Ao insistir no Sufixo A, você se rende ao binarismo, à heteronormatividade, forçando a menina a ser algo diferente do conceito que ela almeja: ser uma Wolverine. Isso diminui a garota. Rebaixa ela ao cargo de namorada do Wolverine. Porque é isso que uma WolverinA é.

    Vamos ser coerente com o texto? Que tal essa gatinhaser apenas Wolverine?

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    • Guilherme Smee diz

      Caro Stan, The Man, o WolverinA foi uma piada da mãe da garota com PresidentA, ainda na época em que surgiu o artigo e tinhamos uma presidente eleita democraticamente. Além disso, a literatura feminista adquire algumas outras palavras para o gênero como, por exemplo, corpo, que acaba virando corpa. Mas sim, eu sei que Wolverine abarca os dois gêneros, tanto é que a Panini Brasil tem usado Novíssima Wolverine nas histórias da X-23. O que não faz sentido por eles terem usado Gaviã Arqueira – que é bizarro – para se referir à Kate Bishop. Mas quem disse que vivemos num mundo que faz sentido, não é mesmo? Excelsior, Stan!

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