As Eras dos Quadrinhos, História dos Quadrinhos, quadrinhos
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As Eras dos Quadrinhos – Parte 3

Período de Transição A – Atirando para todos os lados

Captain America #70-72. Repare como o conteúdo das capas da HQ foi mudando.

Captain America #70-72. Repare como o conteúdo das capas da HQ foi mudando.

Durante a Segunda Guerra Mundial, os quadrinhos de super-heróis atingiram seu ápice. Foi durante este período que foram registrados seus maiores números de vendas por exemplar. Segundo Bradford W. Wright, em 1943, os quadrinhos vendiam 25 milhões de cópias por mês. Apenas o título do Capitão Marvel era responsável por mais de 1,5 milhão. A guerra impulsionava os leitores a consumirem quadrinhos, uma vez que os gibis traziam em suas capas os super-heróis enfrentando os cabeças do Eixo. Além disso, milhares de quadrinhos eram levados ao front para que os soldados se sentissem incentivados com as histórias dos heróis.

Captain America #73-75. Repare como o conteúdo da revista foi mudando ainda mais até se transformar em Captain America's Weird Tales.

Captain America #73-75. Repare como o conteúdo da revista foi mudando ainda mais até se transformar em Captain America’s Weird Tales.

Contudo, em 1945, a guerra acabara, e não fora nem Superman nem o Capitão América quem acertara um direto de direita na face de Hitler, mas seres humanos normais. Os soldados aliados haviam vencido a guerra sem a ajuda de superpoderes e, de volta para casa, não estavam mais interessados em superaventuras patrióticas, mas na manutenção de suas famílias. As pessoas começaram a perder o interesse pelas revistas de super-heróis. Personagens como Tocha Humana, Namor, Flash e Lanterna Verde deixaram de ser publicados por volta de 1949. Apenas Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Arqueiro Verde e Aquaman resistiram.

Moon Girl, o título que mais mudou de gêneros durante este período de transição.

Moon Girl, o título que mais mudou de gêneros durante este período de transição.

Surgiram novos gêneros para suplantar a vaga deixada pelos super-heróis. Horror, western, crime, romance. Quadrinhos para todos os gostos. Ken Quattro, em seu artigo sobre as eras dos quadrinhos, mostra muito bem essa mudança no título do Capitão América, entre a edição 70 e 75, quando a revista passa do gênero de super-herói para o horror. Já um título da EC Comics, Moon Girl, variou entre os gêneros até se definir. A edição 5 continha uma história de horror. Na edição 7, o título passou a se chamar Moon Girl Fights Crime, e, no número 9, A Moon, A Girl… Romance. Passou, definitivamente, a se chamar Weird Fantasy na edição 13 e a trazer histórias de horror.

Mas e estas histórias de horror, romance e crime? Podem ser incluídas como parte da Era de Ouro dos Super-Heróis? Alguns autores resolvem essa questão rotulando este período como uma era à parte. Roberto Guedes, por exemplo, chama o período de Era das Trevas, devido ao seu conteúdo. Muitos autores e pesquisadores se referem a ele como a Era Atômica, pela temática voltada ao pânico de uma guerra nuclear. Pode-se também considerá-lo um período de transição: um momento que apresenta os estilos tanto da uma época anterior quanto da seguinte.

Engana-se quem imagina que um período começa onde o outro termina. Tampouco há um limite temporal demarcado e preciso, no qual se interrompem todas as características da Era de Ouro e, uma vez transposto, encontra a Era de Prata, já instalada, a sucedê-lo. Ao pesquisar o assunto, mostra-se comum que entre o fim de um período e o início de outro haja uma época que, de certa forma, faz a intersecção entre eles. Com a análise as Eras seguintes, essa teoria ganha força e se desenvolve.

O sucesso das editoras de horror e crime, como a EC Comics e a Lev Gleason’s, começou a incomodar muita gente. Não somente suas concorrentes, mas pessoas que gostavam de defender a moral e os bons costumes, e julgavam o conteúdo destas publicações ofensivo. Pessoas como o psiquiatra Frederic Wertham. No clima de caça às bruxas dos anos 50, com a perseguição aos comunistas, os quadrinhos também se tornaram alvos da censura. Muitos foram queimados em praças públicas, e seus editores tiveram de responder a comissões no senado que investigavam se os comics eram responsáveis pela delinqüência juvenil, conforme Wertham havia afirmado em seu livro A Sedução do Inocente. A conseqüência direta deste acossamento foi a criação de um código para os quadrinhos e a famigerada Comics Code Authority, que redefiniu a indústria de quadrinhos americana.

Conforme o código, as palavras crime e horror não poderiam mais figurar nas capas das revistas, os gibis não deveriam trazer histórias com elementos de terror, como vampiros e mortos-vivos, seu conteúdo não poderia provocar em seus leitores “emoções vis”, entre outras proibições, fazendo com que a EC e Lev Gleason’s encerrassem suas atividades. Frank Miller disse: “O Comics Code foi a coisa mais idiota e covarde que os quadrinhos já cometeram. Não foi proposta para nos proteger de ninguém, foi resultado de uma conspiração de editoras concorrentes para tirar a EC Comics de ramo”.

Teria a criação do código encerrado a Era de Ouro dos super-heróis, ou ela já havia acabado muito antes? Sempre que o código foi flexibilizado, houve um avanço no conteúdo das histórias em quadrinhos para um novo momento. A Era de Prata, por sua vez, foi o único período em que esse teor foi infantilizado, mas fazendo as mentes dos criadores, sob o cabresto do código, fervilharem para criar novas e incríveis situações para atrair os leitores.

CONTINUA…

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Guilherme “Smee” Sfredo Miorando nasceu em Erechim em 1984. É Mestre em Memória Social e Bens Culturais, onde pesquisa quadrinhos e sexualidades. É especialista em Imagem Publicitária e bacharel em Publicidade e Propaganda. Ministra aula de quadrinhos e trabalha com design editorial e roteiros. Já trabalhou em museus e com venda de livros e publicidade. É pesquisador associado do Cult de Cultura e da ASPAS (Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial). Faz parte do conselho editorial da Não Editora. Co-roteirizou o premiado curta-metragem Todos os Balões vão Para o Céu. Seu livro de contos Vemos as Coisas como Somos foi selecionado pelo IEL-RS em 2012. A partir de 2014, publicou ao menos um quadrinho independente por ano. Loja de Conveniências, sua primeira narrativa longa foi lançada em 2014. Em 2015 participou da coletânea de HQs LGBT Boys Love. Em 2017 colaborou com o quadrinho A Liga dos Pampas de Jader Corrêa, que explora mitos gauchescos. Também lançou Desastres Ambulantes em parceria com Romi Carlos, um quadrinhos sobre segunda guerra mundial e OVNIs, que foi selecionado pelo edital estadual PROAC/SP. Em 2017, publicou Abandonados Pelos Deuses: Sigrid, com Thiago Krening e Cristian Santos e também Fratura Exposta: REDUX com Jader Corrêa. Também escreve os roteiros para os super-heróis portoalegrenses Super Tinga & Abelha-Girl. Mantém o blog sobre quadrinhos splashpages.wordpress.com há mais de 10 anos.

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