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A História em Quadrinhos de Super Heróis Definitiva

Watchmen é a História definitivas de Super-Heróis? NÃO!

Watchmen é a História definitivas de Super-Heróis? NÃO!

E se eu perguntasse qual seria para você a obra que define o gênero dos quadrinhos de super-heróis? O que você me responderia prontamente? Watchmen? O Cavaleiro das Trevas? Grandes Astros: Superman? Eu discordaria. Não acho que seja nenhuma daquelas. E talvez a resposta surpreenda você.

Primeiro vou justificar porque as obras acima não cabem no pressuposto: todas elas sim, homenageam a indústria e a mitologia dos super-heróis, mas todas de certa medida se utilizam da reconstrução do gênero. Elas não reverenciam o gênero em si, mas o refazem, o repensam, refletem. Sim, são muitos RE’s.

“A sociedade Ocidental legitimou o invencível Superman, que os serviu quando o sistema era ameaçado por um inimigo invencível. O Batman apareceu quando Dick Tracy não estava mais disponível para lidar com os grandes crimes. O Homem-Aranha se juntou ao elenco de heróis quando nós não éramos mais inocentes o suficiente no que tangia à perfeição dos nossos super-heróis; e o Spirit veio quando deveria haver um caso perfeito de heroísmo que não eraa terá natal de homens e mulheres supermutantes”, nos diz Will Eisner, resumindo um pouco a histórias dos super-heróis, fazendo marketing para seu personagem e explicando o que é ser um super-herói. A DC e a Marvel sempre de tiveram os principais personagens que representaram esse gênero. Os Vingadores e a Liga da Justiça foram as equipes que mais heróis desse universo comportaram (ok, sem contar a Legião dos Super-Heróis e os X-Men). Então é por isso que eu escolho LJA/Vingadores como a história em quadrinhos definitiva de super-heróis.

O Crossover Original entre Liga da Justiça e Vingadores.

O Crossover Original entre Liga da Justiça e Vingadores.

Pra começar vamos falar que esse encontro entre equipes foi planejado há muito tempo. 1983. Os envolvidos eram Len Wein, Dick Giordano, Mark Gruenwald, Jim Shooter, Marv Wolfman, Roy Thomas e, a pessoa essencial nessa história toda, George Pérez. A essas alturas Pérez já havia trabalhado com as duas equipes e era o mais indicado para conduzir os desenhos. Mas houve muitos imbróglios e a revista acabou não saindo. Naquele tempo havia algo como uma Guerra Fria entre a Marvel e a DC. As coisas só melhoraram quando da idealização do megacrossover Mavel vs. DC/Dc vs. Marvel. Então saíram muitos e muitos encontros de heróis. Mas o problema do megacrossover era o roteiro, não era bem amarrado e as lutas entre heróis eram decididas através de votos de fãs – lembrando quando a morte de Jason Todd, o segundo Robin, foi decidida por telefonemas dos fanáticos.

Na mesma época  em que o megacrossover era publicado, senão um pouco antes, dois artífices da indústria super-heróistica eram catapultados para a fama através da minissérie Marvels. O primeiro deles, Alex Ross, cuja arte pintada a guache revelava uma terceira dimensão nunca vista antes com tamanha maestria em revistas de super-heróis, foi considerado o Norman Rockwell da indústria, o desenhista definitivo dos superpoderosos. Fez diversos trabalhos seminais que poderiam comprovar isso, como O Reino do Amanhã, em parceria com Mark Waid e os álbuns gigantes dos heróis DC junto a Paul Dini. Toda essa ovação a Ross, acabou eclipsando um pouco o roteirista, Kurt Busiek. É claro que ele foi aclamado. Fazendo parte da terceira geração de fãs de quadrinhos que se colocou na indústria, Busiek era o rei dos nerds. Sua veneração pela história das histórias em quadrinhos, os detalhes e a caracterização dos personagens, vistos através do olhar do homem-comum, garantiu à Marvels uma quarta dimensão (Duendes?) que ia muito além da pintura de Ross.

As capa de Marvels - por Alex Ross

As capas de Marvels – por Alex Ross

Irônico é saber da história por trás da formação de leitura de Busiek. Segundo Rodrigo Salem: “O pequeno Kurt era proibido de ler quadrinhos quando criança. Seus pais foram duas vítimas da paranoia despertada pelo livro A sedução dos inocentes, do psicólogo Fredric Wertham, que colocava as HQs (principalmente as de terror) como porta de entrada da perversão e violência na juventude americana. Busiek passou a dividir o tempo de leitura com livros e obras ‘família’ como Tintin, Asterix, Snoopy e Pogo. (…) Na verdade a censura familiar foi essencial para o estilo de Kurt Busiek. Você não vai ver as obscenidades de Mark Millar, a psicodelia de Grant Morrison ou a violência narrativa de Brian Michael Bendis, mas talvez não haja um escritor que construa arcos tão ágeis e limpos nos quadrinhos atuais. Ele não apela, não deixa seu estilo passar em cima dos personagens e histórias. Suas narrativas exalam novidade ao mesmo tempo em que passeiam, com desenvoltura, pela Era de Ouro dos quadrinhos”.

Bem-Vindo à Astro City

Bem-Vindo à Astro City! Uma grande festa para todos os tipos e arquétipos de super-heróis espera você!

Já deu pra dar uma sacada por que Busiek é tão importante para indústria de super-heróis, né, mas ainda não cheguei lá. Logo depois de Marvels, Busiek desenvolveu para a Image, em parceria com Ross e Brent Anderson, Astro City. A história era uma grande homenagem, uma grande festa para todos os tipos e arquétipos de super-heróis. Havia desde o Superman e a Mulher-Maravilha, a Zorro e o Quarteto Fantástico. Numa cidade onde ser super era o mais comum. As histórias abriam com uma placa verde dizendo: “Bem-Vindo à Astro City” e acabavam com a mesma placa dizendo: “Você está deixando Astro City”. “Na minha mente, cada história de Astro City deve ser uma metáfora para algo que acontece na vida real”, nos conta Busiek, “São as múltiplas perspectivas nas histórias de super-heróis, para mim, que são a chave de Astro City. Na Marvel e na DC, a principal premissa dos seus quadrinhos é tornar você um espectador da ação, mas eu quero entrar na cabeça de alguém , nas emoções de alguém. O que eu quero dizer é: Aqui está a luta. Veja o cara observando-a, ele está atrasado para o trabalho, ele não pode atravessar a cidade porque há uma luta de super-heróis no seu caminho. O que acontecerá com sua vida? Como é para ele?  Estou supondo que essa realidade alternativa existe e estou jogando com as regras dela”.

Jogar com as regras dela. Boa definição, Kurt. Enquanto outros escritores mais respeitados vão lá e emaranham o fio do novelo, você vai e costura um belo suéter, com linhas bem amarradas e uma mescla incrível de cores e padrões. Com essas suas agulhas de tricô você nos trouxe histórias em que vilões se tornam heróis (Thunderbolts), em que heróis se tornam vilões (JLA), em que um menino comum do Kansas se torna o maior herói do Mundo (Superman: Identidade Secreta) e os primeiros dias de um atormentado herói (Arquivos Secretos do Homem-Aranha). Mas o feito que levou Busiek ser escolhido a pessoa certa para dar forma a Vingadores/LJA foi a parceria com George Pérez em Vingadores, durante o “retorno às raízes” dos Heróis Retornam.

A Crise nas Infinitas Terras, de Marv Wolfman e Kurt Busiek, para comememorar e unificar os 50 Anos da DC Comics.

A Crise nas Infinitas Terras, de Marv Wolfman e George Pérez, para comememorar e unificar os 50 Anos da DC Comics.

Pérez, dono de um estilo distinto, com profundas raízes no melhor da tradição super-heroística, é conhecido pela sua riqueza de detalhes. (Opa, um ponto em comum com Busiek!) Suas hachuras tão características, dão volume para os corpos dos heróis. Seus layouts de muitos quadros por página e sua habilidade de preenchê-los com cenários incríveis e personagens com expressões marcantes o tornam um artista atemporal. Enquanto outros ficam marcados pelo tempo e pelo estilo, Pérez soube adaptar-se na indústria ao longo dos anos em que trabalhou em títulos como Novos Titãs, Mulher-Maravilha, LJA, Vingadores e, talvez o mais importante de todos, Crise nas Infinitas Terras. Foi lá que a habilidade detalhista de Pérez foi testada ao extremo. Ele teve de desenhar praticamente TODOS os personagens da DC da época, inclusive aqueles que pertenciam a outras Terras (não pergunte, senão isso aqui vai dar umas 10 páginas de explicação). Ele também trabalhou como roteirista na série da Mulher-Maravilha, que sucedeu o megaevento Crise. Com roteiros densos e verborrágicos, que marcaram época, inovando em estilo e composição, talvez a passagem de Pérez pelo título da princesa amazona tenha sido aquela que melhor define a personagem, justamente por aliar sua origem aos mitos e lendas greco-romanas.

Capa de JLA/Avengers#1. O definitivo!

Capa de JLA/Avengers#1. O definitivo! Melhor. Quadrinho de Super-Heróis. De todos os tempos.

Juntar Pérez e Busiek parecia, então, algo natural. E isso aconteceu com Vingadores. Perguntado como funcionava a relação entre os dois artistas, Busiek respondeu: “Fazer um roteiro estilo argumento dá ao artista mais liberdade, o que pode ser uma coisa boa, especialmente se for o tipo certo de artista. Se eu fizesse um roteiro completo para George Pérez isso seria terrivelmente confinante para ele”. ele completa com “Para mim, a conexão entre a escrita e a arte é a parte divertida. É o que faz os quadrinhos funcionarem. Então eu aprecio mais escrever quadrinhos quando eu tenho muito contato com o artista, quando eu tenho um senso do que ele quer desenhar e do que ele mais gosta”.

Bem falei, falei sobre os criadores e não falei sobre a história de LJA/Vingadores, de 2004. Não vou revelar spoilers, mas vou dizer o que você pode esperar (em ítens!)

  1. Reunião de inúmeros e inúmeros super-heróis das duas editoras em desenhos embasbacantes que você se pergunta como é que George Pérez teve tanta paciência ;
  2. Roteiro bem amarrado explorando a personalidade de cada herói e sua história pregressa;
  3. Nostalgia: homenagens e mais homenagens à cronologia e histórias dos super-heróis, como a clássica Vingadores VS. Defensores, que serve como inspiração à história;
  4. Extras e mais extras falando de crossovers anteriores, dos por trás da prancheta ao longo dos anos, artes originais de Pérez para a primeira versão do encontro;
  5. Viagens no tempo e para todo o canto dos universos Marvel e DC;
  6. Descobrir do que é feito um herói do Universo Marvel e do que é feito um herói do Universo DC;
  7. Lutas, lutas e mais lutas, do tipo quem é o mais poderoso, mas muito diferente do que foi feito nos anos 90;
  8. O que aconteceria se os heróis vivessem no mesmo universo?
  9. O que aconteceria nos encontros anuais dos super-heróis?
  10. Um grande roteiro e uma arte sensacional (mas isso eu já disse!)

Para mim  Vingadores/LJA pode ser a história em quadrinhos de super-herói definitiva, mas, perguntado sobre o atual estado dos genro super-heróis, Kurt respondeu: “Vejo o genro de super-heróis como um grande campo, e nós construímos essa cidade gigantesca num cantinho. Acontece que, de vez em quando, algum carinha visionário dirige para fora da cidade e viaja para uma direção diferente e todo mundo diz: “Olha, olha – dá para se fazer isso!”, e eles fazem um comboio que o segue pelo mesmo caminho. Eu penso que a lição que precisamos aprender de coisas como Watchmen, O Cavaleiro das Trevas, Homem-Animal e o Quarteto Fantástico (feito por Lee e Kirby), não é dizer, “Olha, existe uma nova direção que pode funcionar”, é sair da cidadezinha e encontrar sua própria direção. Nós devemos tentar explorar esse campo o mais que pudermos, ao invés de construir um outro bairro e então construir sobre ele até que ninguém queira mesmo viver lá”.

E para você? Qual é a história em quadrinhos de super-herói definitiva e por quê? Deixe seu comentário!

7 comentários

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  2. celsonunes10 diz

    Ótimo artigo. Concordo plenamente com seus argumentos, uma vez que essa é uma história sensacional para mim também.

    Viu.. Há um erro na legenda da imagem que faia da Crise nas Infinitas Terras.

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  3. celsonunes10 diz

    Olá, gostei muito do artigo, pois eu também considero essa como a melhor história em quadrinhos de todas. Sou fã dos Vingadores, de longa data, e finalmente, nos tempos atuais, vejo eles como os principais da Marvel.

    Encontrei um erro no legenda da imagem sobre a Crise nas Infinitas Terras.

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